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refs. #31 Papinho de Terapia
os riscos da difusão da linguagem psi em nossas relações e na cultura.
trauma, limites, narcisismo, tóxico, gatilhos, depressão, ansiedade… termos do consultório de terapia se infiltraram na cultura de massa e em nossas conversas cotidianas. o tal do Therapy Talk está por tudo: do livro de memórias do Príncipe Harry às letras da Taylor Swift, de seriados adolescentes como Euphoria até as novelas. habitar a Era do Papinho de Terapia é a estranha sensação de que, por mais que se fale tanto sobre saúde mental nas nossas bolhas, “ninguém está bem”. talvez nossa fixação pela terapia seja tanto um sintoma quanto uma cura.
vivemos uma época de terapeutização da cultura e das relações. e à medida que a saúde mental entrou na pauta de tantos de nós, fomos adquirindo uma espécie de “linguagem psi”. por um lado, tudo isso amplia a relevância do campo psicológico e diminui preconceitos. por outro, esses conceitos também são absorvidos e utilizados de maneira superficial e equivocada, às vezes a partir de um vídeo de 30 segundos no TikTok; ou mesmo, passam a ser usados de forma defensiva e manipuladora nas relações pessoais.
afinal, o que fazer quando a saúde mental passa a ser tratada como mais uma vertical de conteúdo?
para elaborar essas e outras questões, contamos com as participações da doutora em teoria psicanalítica e professora da UNIRIO Nina Saroldi e da escritora e entusiasta da psicanálise Tati Bernardi.
e para ampliar ainda mais a discussão, reunimos abaixo algumas referências que nos ajudam a articular este tema. lembrando que o Vibes em Análise está com uma parceria com a livraria on-line Dois Pontos, que faz uma curadoria incrível de publicações, além de muito conteúdo pra que você encontre o livro que procura e o que nem sabia que estava procurando.
você pode comprar muitos dos livros que indicamos no episódio com 20% de desconto usando o nosso cupom "FLOATVIBES"
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1. A TERAPEUTIZAÇÃO DA CULTURA
nos últimos anos, o crescimento da preocupação com saúde mental é inegável, especialmente depois da pandemia de COVID-19. tanto nos EUA quanto no Brasil, país mais ansioso do mundo. consequentemente, a gramática da saúde mental passou a fazer parte do dia-a-dia, das mídias sociais aos aplicativos de relacionamentos. ganharam força os “selos de verificação" "estar com a terapia em dia”. ou mesmo casos como do ator Jonah Hill e a apropriação de um discurso terapeutizado a serviço de comportamentos abusivos.
mas quais são os efeitos de tudo isso? será que o Papinho de Terapia está nos tornando egoístas, como provoca o artigo do Bustle? ou mesmo arruinando nossas relações, conforme analisa o Refinery29? ou nos deixando mais solitários, como aponta a psicoterapeuta e especialista em relacionamentos Esther Perel? afinal, quais os limites da saúde mental pronta pra consumo que inunda nossas falas e nossos conteúdos?
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2 . BIOGRAFIA DA DEPRESSÃO — CHRISTIAN DUNKER
o psicanalista Christian Dunker faz uma investigação aprofundada sobre como a Depressão tornou-se um significante tão inflado no contemporâneo — e tão rentável para a indústria farmacêutica. além da depressão, ansiedade, burnout, TDAH e outros diagnósticos tornaram-se combustível da mídia de massa e das mídias sociais, impulsionando conteúdos terapeutizantes (ou até mesmo retraumatizantes).
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3. ENTRE SESSÕES — LUCAS LIEDKE
“o potencial de transversalidade da psicanálise é fascinante, mas cabe a nós ter mais coragem para levá-lo mais a sério.”
essa é uma das ideias que o Lucas Liedke elaborou em seu livroEntre Sessões. o capítulo Insta-Therapy traz boas provocações sobre como o conteúdo terapêutico, somado à lógica do algoritmo, pode se tornar uma grande armadilha para todos nós. para quem busca uma versão resumida, vale a vibe INSTA-THERAPY que publicamos lá 2020 no Instagram da float. também sugerimos escutar o nosso episódio especial sobre o livro Entre Sessões.
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4. DELÍRIO DE PODER — MARCIA TIBURI
o livro da filósofa analisa discursos e ferramentas que passaram a interferir na percepção da sociedade em relação a fatos políticos – pessoais e públicos. é uma belíssima aula sobre o poder das distorções no tecnoneoliberalismo, além de um lembrete de que nem todos os discursos positivos estão à serviço da boa-fé e da consciência crítica.
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5 . VIBES: ANTITERAPIA
na float, costumamos dizer que toda tendência anda de mãos dadas com a contratendência. simplificando bastante, não há movimento hegemônico que não provoque reações. nesse sentido, podemos pensar em um movimento de reação ao Papinho de Terapia que anda bem forte: os ataques cada vez mais fortes à psicanálise e aos cuidados com a saúde mental. vale ler o texto do psicanalista Mário Eduardo Costa Pereira com o neurocientista Sidarta Ribeiro na Folha. e também o texto de André Alves sobre a ciência lacração. no balanço geral, talvez a grande questão seja a provocação do episódio do Greg News sobre psicanálise: “o fato é que, muito mais importante do que discutir se a psicanálise é ou não é ciência, é discutir por que ela é tão pouco acessível”.
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e para quem quer mais, seguem alguns links adicionais:
— a NY Magazine fez uma bela edição sobre como o psiquiatra Bessel van der Kolk transformou o trauma em um diagnóstico popular "demais" nos EUA;
— o artigo do Atlantic sobre como poucos termos da psicologia são tão mal interpretados quanto "boundaries/limites";
— no show do Papinho de Terapia, narcisismo é uma das grandes estrelas. esse termo tão debatido, usado e gasto pode ser melhor compreendido na edição da revista Cult organizada pelo professor e psicanalista Daniel Kupermann;
— a edição da New Yorker sobre como terapia é uma característica distintiva da vida contemporânea;
— o Happycracia, livro do Edgar Cabanas com a Eva Illouz, faz uma bela análise sócio-histórica da ideia de que a felicidade é o maior objetivo da vida e que basta força de vontade para alcançá-la;
— The Distance Cure, livro da Hannah Zeavin que propõe uma tríade: terapeuta, paciente e tecnologia de comunicação. Zeavin nos diz que nunca foi apenas uma "cura pela fala"; sempre foi uma cura pela comunicação;
— vale buscar mais trabalhos das nossas convidadas, como o podcast Meu Inconsciente Coletivo da Tati Bernardi e os cursos da Nina Saroldi na Casa do Saber;
— "Sobre psicanálise selvagem”, texto clássico do Freud de 1910 sobre os perigos do uso dos conceitos de maneira selvagem, sem escrúpulos e até agressiva;
— a clássica entrevista do Freud na qual ele fala sobre a importância de não deixar que o excesso de análise arruine a fruição das coisas simples da vida.
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bons papos de terapia por aí… e até o próximo episódio!
refs. #31 Papinho de Terapia
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